domingo, 5 de setembro de 2010

O Show de Truman




O filme O Show de Truman conta a história de um pacato vendedor de seguros em uma pequena cidade interiorana chamada Seaheaven. Até aí nada demais. Entretanto Truman é vigiado em tempo integral por câmeras ocultas, que o tornam um astro involuntário do maior reality-show já produzido, um perfeito exemplo do que Orwell previa com seu Grande Irmão.

Superficialmente o filme é apenas mais uma comédia de um ator caricato que se repete a cada nova interpretação, mas carrega junto a si em uma análise mais meticulosa, um amálgama de questões profundas e filosóficas. Truman aos olhos de seus fãs, que o acompanham desde o nascimento, é uma estrela. Todos se emocionam com sua vida. Mas aos nossos olhos, ele aparece como a síntese máxima de uma pessoa que se transformou em mercadoria midiática e, através de seus conflitos e simplicidade vamos percebendo aos poucos o quão cruel pode ser a mídia e a necessidade de exploração da imagem.

Além disso, há no filme outras perspectivas possíveis para os fatos, há a nossa, observadores oniscientes, há a de Truman, vítima ignorante do que se passa à sua volta e há a dos outros participantes, que mesmo após “saírem” do show, não conseguem se livrar dele, acompanhando-o pela TV (o que deveria levá-los a uma mudança de perspectiva nas coisas). Truman vive ilhado em um mundo de fantasia, onde tudo é controlado por forças externas às quais ele desconhece, é um prisioneiro, um brinquedo televisivo que acaba por representar grande parte de nossa sociedade, que vive atrelada às manipulações de quem lhes dita a forma de viver a própria vida e do que deve assistir, comer, vestir e escutar.

No filme, há ainda a tentativa de alguns atores de alertar Truman da mentira em que vive. Mas aqueles que assim agem são expulsos do filme e uma explicação lógica é adaptada ao roteiro. Roteiro que aliás é elaborado cruelmente, para que Truman nunca saia de Seaheaven e descubra o mundo verdadeiro que escondem dele. Quando Truman começa a desejar expandir seu mundo e conhecer outros locais (que o levariam para fora de seu cenário) os produtores fazem todo o possível para afastá-lo de seus anseios, algo na verdade não muito diferente do que ocorre no mundo real, pois sempre que alguém chega perto da verdade que aflige aos poderosos, estes por sua vez usam de seu poder para fazer o povo mudar de idéia, e se não conseguir pela manipulação, pelo medo.

E finalmente, após milhares de episódios, seu mundo se torna pequeno demais, e Truman sai em busca do que há lá fora (mesmo saber que literalmente é algo que está lá fora) e parte em uma jornada onde enfrenta seu medo do mar e todas as dificuldades impostas pela produção que faz o possível para causar seu insucesso e salvar o programa. Assistido com deleite pelos seus milhares de fãs, Truman finalmente descobre a verdade (ou a mentira), e sai pela porta que separa o seu mundo do novo mundo que o espera com uma típica frase de shows americanos “caso não os veja de novo, tenham uma boa tarde e uma boa noite”. Seu público grita eufórico, emocionado, mas em nenhum momento se lembra que sem público para assistir, não existiria esta falácia. E é isso que nunca lembramos quando nos sentamos sem questionamentos em frente à TV e assistimos qualquer coisa que esteja passando.


Referência bibliográfica:

WEIR, Peter. O show de Truman: o show da vida. Estados Unidos: Paramount Pictures, 1998.

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