terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Los Porongas e a análise tripartite

Tomando por base Cynthia Freeland e a análise tripartite na Teoria da Arte, que busca compreender as propriedades formais e materiais; o conteúdo e o contexto ao qual o trabalho está inserido, tomemos como objeto de estudo a banda Los Porongas, na tentativa de, através da análise, estabelecer de que forma o belo e os conceitos de beleza podem estar sendo percebidos pela comunidade e sob certa perspectiva, defender o trabalho assim como a crítica Lucy Lippard o fez com Serrano.

Vamos começar pelo título sintomático de seu primeiro trabalho, “Enquanto uns dormem”, é preciso, assim como diz na música Espelho de Narciso, precisão. Caso contrário, acha-se o avesso do inverso do verso. A banda prima pela poesia, deste modo, é impregnada de diversas formas de interpretação, mas, para mim, e para uma grande parcela de fãs da banda, “Enquanto uns dormem, o Porongas correm atrás”. Ao mostrar a capa do CD e o título à minha esposa, dizendo que era possivelmente a melhor banda do Acre na atualidade, o Los Porongas lhe pareceu promissor. Ouvindo, entretanto, ficou decepcionada. Certamente isto ocorre na mesma proporção em que eles encantam velhos fãs e arregimentam novos, pois fugir dos clichês e ter personalidade própria, ao mesmo tempo, em que rema contra a maré e faz música autoral não é tarefa fácil no cenário artístico musical contemporâneo. O professor Carlos Rogério Duarte aponta árduo caminho trilhado pelo Los Porongas ao retratar a lógica ideológica deste cenário musical:

“já vem se delineando – espero que já venha se delineando – na música independente uma outra lógica: as canções ou músicas são obras de arte; a produção, de custos baixos e de qualidade, é sobretudo resultado de paixão; a diversidade é condição necessária, já que a pretensão não é fazer que o artista se torne produto consumível, mas que ele seja admirado pelas qualidades estéticas intrínsecas a sua obra”

Desta forma, fica claro que o título “Enquanto uns dormem” é uma alusão a esta realidade ideológica à qual o Los Porongas está imerso ativa e psicologicamente. Alguns dormem no público, não conseguem ainda sonhar com uma banda como o Los Porongas por sua limitação auditiva ou cultural. Outros dormem no cenário descrito por Rogério Duarte, e deixam de seguir os passos que os levariam ao encontro de seus anseios. Outros dormem atrás de mesas de gravadoras, sonhando com produtos prontos para o consumo de uma geração coca-cola, twitter e ipod que busca a “melhor banda de todos os tempos da última semana (Titãs)”. Enquanto isso, o Los Porongas também sonha, mas belamente acordado.

Com relação às qualidades materiais do Los Porongas, vamos considerar de imediato o significado intencional dos artistas. O Los Porongas deixa claro sua proposta em seu site oficial:

“Os Los Porongas ficaram conhecidos no circuito Acre-Rondônia pela sonoridade difícil de rotular, pelo zelo com a construção poética das músicas e pela preocupação em fortalecer a cena musical urbana da região (...) A diversidade de influências musicais é essencial para a construção da sonoridade da banda”

Esta atitude, do Los Porongas, se assemelha muito à de Serrano, na análise de seu trabalho feita por Lippard “mostrar como a nossa cultura contemporânea está comercializando e está pechinchando o Cristianismo e os seus ícones”. Encontramos a mesma atitude do Los Porongas ao trocar o cristianismo pelo cenário musical e as bandas deste cenário. Esta postura, aliada à sua musicalidade e a música realizada de forma autoral do Los Porongas é o fator que mais significado incorpora ao trabalho em sua definição de obra de arte. Segundo Jakobson (2005): “É precisamente essa interconexão das partes, assim como sua integração em um todo composicional, que funciona como o próprio signatum da música”.

Precisamos neste ponto situar o Los Porongas em seu contexto social e artístico para compreender seu percurso musical. Esta etapa do processo, amparando-se também em fragmentos do processo tripartite proposta por Molino agrega também informações externas ao fato musical, que também pode lhe conferir novos significados, ou reforçar os já existentes (NATTIEZ 2005). Neste sentido, toma grande importância o local de nascimento da banda. O Acre, Estado longínquo, do eixo Rio-São Paulo, terra de seringueiros, florestas e o mito que envolve Chico Mendes e a dita Florestania, que virou slogan político. Mas isto não significa que estejam longe do restante do Brasil:

“Com esse aquecimento cultural, as cenas locais produzem uma espécie de consciência coletiva de que é possível interferir no mundo, por mais distante que se esteja dos grandes centros culturais (Diogo Soares)”.

Este modo acreano de vida, que respira um ar diferente do restante do Brasil, de um lugar que em um passado não muito remoto foi negado pelo próprio Brasil, e foi posteriormente aceito como um pedaço de Brasil através do sangue derramado de muitos seringueiros impregna o Los Porongas, daí talvez resida sua busca por uma identidade própria. Nem bolivianos, nem peruanos, nem brasileiros, simplesmente acreanos. De outro lado, “Na diversidade de influências da banda, estão presentes Beatles, Radiohead, Kula Shaker Ocean Colour Scene, Moby, Nirvana, Gilberto Gil, Los Hermanos, The Smiths, Oasis, The Yeah, Yeah, Yeahs, Stone Roses, Vanguart, Superguidis, Chico Science e Nação Zumbi (My Space Oficial Los Porongas)”. Esta influência cultural foi absorvida em grande porcentagem pelos Los Porongas, e deste cadinho saiu um estilo único, nem rock, nem MPB, nem Indie, apenas uma bela obra de Arte definida como Los Porongas.

Referências:


FREELAND, Cynthia, Teoria da Arte, tradução, CASTRO, Beatriz Magalhães, UNB.
PIOVESAN, Lucas, A Teoria Semiológica Tripartite http://www.scribd.com/doc/17114611/CAPITULO-2 Acesso: 05/11/2009
DUARTE, Carlos Rogério, A métrica do Grito < http://ametricadogrito.blogspot.com/ > Acesso: 07/11/2009
Los Porongas site Oficial: < http://www.losporongas.com.br/> Acesso: 07/11/2009Myspace Los Porongas: <http://www.myspace.com.br/losporongas> Acesso: 07/11/2009

Nenhum comentário:

Postar um comentário