quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Conceituando o que é arte

Segundo a introdução do livro História da Arte, de Ernst Gombrich, “Não existe realmente a que se possa dar o nome Arte. Existem somente artistas (pág.01).” Esta idéia, que resume bem o raciocínio que se segue, hoje , após a leitura atenciosa do texto faz sentido para mim, mas até então não a considerava tão verdadeira. Acreditava que, Arte era passível de definições claras e inequívocas, com certa predisposição ao maniqueísmo, é arte ou não é arte.

Mas Gombrich deixa claro que existem muitas tonalidades de cinza entre o “chiaroescuro”, e a arte está sujeita a mais definições errôneas ou incompletas do que imaginamos e que é extremamente fácil cair no erro de acreditar que a arte deve se orientar apenas pelo belo. Gombrich cita exemplos perfeitos da arte que repudia, causa ojeriza, se afasta do belo, sem no entanto deixar de ser arte ou de ter sua própria beleza. Exemplos como o quadro da mãe de Albrecht Dürer, que é fascinante por retratar mais que um rosto, indo até o âmago do artista e da retratada. Para mim, até então, arte era um tanto vinculada à beleza, onde não havia aprendido ainda a separar a beleza da obra com a beleza de seu tema, como Gombrich afirma: “De fato não tardaremos em descobrir que a beleza de um quadro não reside realmente na beleza de seu tema (pág 04)”.

Além disso, o autor também alude ao fato de que os padrões de beleza e os gostos variam muito. Esta regra é válida para a época, a cultura, os povos e ao olhar único que cada um lança sobre as coisas. Antes, acreditava que poderia existir um padrão estético universal, algo que fosse capaz de agradar a todos. Nem o Jesus de Toscano nem o de Guido Reni agradou a todos (e nem o da Bíblia), o que deixa claro que este padrão universal jamais existirá, e cada obra será vista de uma forma diferente por cada pessoa.

Segundo Gombrich, os artistas principiantes costumam cometer um erro ao qual já cai algumas vezes “Querem admirar a perícia do artista em representar as coisas tal como eles as vêem. Gostam mais de pinturas que “parecem reais”.” Erro comum. Principalmente se levarmos em conta o grau de desenvolvimento para a compreensão da arte e do que o artista desejou exprimir com sua obra. Uma criança não verá da mesma forma que um adulto, do mesmo modo, um camponês da idade média não entenderia a arte como um boêmio carioca. Por isso, é irrelevante se a obra é realista ou não, se apresenta muitos detalhes ou se é expressa em poucas linhas como no traço vigoroso do elefante de Rembrant ou as formas caricatas do galo de Picasso. Ninguém pode negar que se assim desejasse, ambos poderiam ter realizados desenhos bem mais complexos e “realistas”, mas a forma pela qual expressaram, foi a melhor para aquilo a que se propuseram. Após analisar as comparações tecidas por Gombrich no decorrer das páginas, não consigo mais me ver julgando a qualidade de uma obra apenas por seu aspecto “realista”. Outro aspecto importante que é ressaltado por Gombrich é com relação aos erros de interpretação aos quais estamos sempre sujeitos. Nisto, o exemplo dos cavalos apresentado por ele, é perfeito. E às vezes o erro está tão absorvido pela nossa mente que mesmo depois quando nos defrontamos com ele, não aceitamos a realidade. Foi o que ocorreu quando com o advento das fotografias mostrou-se a forma correta do galope dos cavalos. Quem se dispôs a corrigir o trote, caiu do cavalo e não foi bem recebido “(...)choveram reclamações de que as imagens pareciam esquisitas, erradas (pág. 14)”. Quantas vezes não agimos assim? Acreditando que não estamos sujeitos à falhas de interpretação da realidade? Com a leitura destes poucos exemplos, tenho certeza que estarei um pouco mais atento para não acreditar que meus cinco sentidos sempre me mostram o mundo como ele é, pois afinal, na maioria das vezes o que ocorre é o contrário, pois tão limitados somos que nossa interpretação da realidade nunca poderá ser mais que isso, interpretação.

Entretanto, uma das lições mais valiosas aparece quando Gombrich afirma “Não existe maior obstáculo à fruição de grandes obras de arte do que nossa relutância em descartar hábitos e preconceitos”. Esta idéia confirma o anteriormente afirmado e nos leva a novos questionamentos. Ele cita exemplos eclesiásticos, onde as criações humanas como as feições de Jesus nos quadros foram absorvidas como verdades eternas e imutáveis, chegando a constituir blasfêmia duvidar do que se tornaram como representação da realidade. Citou o exemplo contundente de Caravaggio, que teve de se autocensurar e refazer usa obra, perdendo no mínimo, a essência da idéia original... “Esta história retrata bem o dano que pode ser causado por aqueles que repudiam e criticam obras de arte pelos motivos errados (pág 18)”. Quantas vezes não agimos assim? Ser apresentado a este exemplo de Caravaggio alterou o modo pelo qual via esta questão, que achava sem importância. “Gosto é gosto, quem não gosta azar” costumava pensar. Mas a questão vai um pouco além como pudemos perceber claramente.

E por fim, a meticulosidade adquiriu uma nova forma para meus olhos. Segundo ele, a meticulosidade, tão chata no seu uso diário, para o artista, acaba sendo o que poderá distinguir o bom do “sublime”. E por isso, desde já, estou pensando em como transpor a minha meticulosidade (tão criticada pela minha esposa) para o campo da arte. E, não menos importante que tudo que foi destacado até aqui, também me impressionou é a forma fria com que algumas pessoas olham a arte, tentando rotulá-la, limitá-la, resumi-la a notas de rodapé em catálogos de arte no que ele definiu como semiconhecimento ou esnobismo. Segundo o autor, até mesmo um livro como o dele pode ajudar a incutir esta atitude em alguém. Pelo menos com relação à mim Gombrich pode ficar tranqüilo, entendi sua mensagem.

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